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Os benefícios das mentorias para a indústria de tradução
Por Gisley Rabello Ferreira
Fala-se tanto em mentoria hoje em dia, e cada vez mais vemos ofertas desse tipo na indústria da tradução. Mas será mesmo que a mentoria é uma maneira eficaz de avançar como profissional de tradução? Como saber se as mentorias disponíveis por aí são confiáveis? Quais são as qualidades de um bom mentor? Quais são as reais vantagens que a mentoria pode gerar para a categoria e para a indústria? Para os iniciantes nesse mercado tão difuso e cheio de possibilidades, há mais dúvidas do que certezas sobre como e onde procurar auxílio. E os tradutores já estabelecidos nem sempre sabem que sua ajuda pode ser preciosa, não só para o seu próprio crescimento profissional, mas também para a valorização geral da categoria. Há inúmeros motivos para que os tradutores profissionais, as instituições de ensino e até mesmo as empresas do setor de tradução apoiem tais iniciativas.
A mentoria consiste na orientação e no aconselhamento personalizado ofertados por profissionais mais experientes, os mentores, a iniciantes, os mentorados, com o objetivo de desenvolver suas metas profissionais de forma objetiva e dentro dos padrões éticos esperados pela classe e pelo mercado. Nesse processo, mentor e mentorado se encontram durante um período para discussões sobre temas relacionados à profissão e ao mercado de trabalho. Durante as reuniões, o profissional mais experiente sugere caminhos e debate com o mentorado possíveis opções para que ele consiga progredir e ter bons resultados dentro de suas aspirações profissionais. Entretanto, ao contrário do que algumas pessoas imaginam, o mentorado não é um aluno nesse tipo de programa e não tem aulas práticas com o mentor. Nas mentorias, espera-se que o iniciante já esteja formado, ou esteja terminando sua formação, prestes a ingressar no mercado de tradução, antes de ser atendido por esse tipo de programa. Isso porque o papel do mentor não é ensinar o mentorado a traduzir. Seus ensinamentos vão muito além disso, pois guiam o iniciante rumo ao mercado de trabalho, garantindo que este esteja munido de informações valiosas para que sobreviva e prospere no ramo. Ele dá orientações importantes sobre todos os aspectos da profissão. Assuntos como prospecção de clientes, controle de qualidade, geração de orçamentos, práticas do mercado, contabilidade, organização do tempo, entre outros, são de extrema valia para quem não tem experiência e são abordados pelo mentor. Por isso, é essencial escolher bem onde buscar esse tipo de orientação.
O mentor ideal é aquele que tem uma bagagem profissional considerável, alguém reconhecido no mercado, um profissional respeitado, ético e, acima de tudo, disposto a contribuir para elevar o nível dos profissionais da comunidade. Tudo isso, preferencialmente, por meio do voluntariado. É por essa razão que os melhores lugares para encontrar mentorias de qualidade são as associações de classe. Nessas instituições, os mentores se dispõem a auxiliar os novatos a ingressar no mercado e na comunidade de profissionais da tradução de forma ética, com todas as informações para que se capacitem e, assim, poderem oferecer serviços de alto nível a seus clientes, o que beneficia toda a categoria e, por tabela, a indústria como um todo. Uma comunidade de profissionais coesa e fortalecida por suas associações é respeitada por toda a indústria e também pelos clientes que consomem os serviços prestados por ela.
O Programa de Mentoria da ABRATES, por exemplo, que foi criado em 2016 pela associação na gestão de William Cassemiro, se inspirou em muitos programas de mentoria bem-sucedidos, oferecidos por associações de tradutores de vários países. Hoje é um programa de sucesso, que se mantém atuante ano após ano, auxiliando iniciantes de tradução e interpretação a atuarem de forma profissional e ética no mercado, com a ajuda preciosa de seus voluntários. Muitos dos mentorados já assistidos pelo programa tornaram-se profissionais de sucesso e alguns hoje são empresários de tradução que atuam brilhantemente no mercado. Uma das ex-mentoradas retornou recentemente ao programa como mentora e, dessa maneira, realizou o desejo de retribuir a ajuda recebida no início de sua carreira. Atualmente, assim como a ABRATES, muitas outras associações em todo o mundo seguem oferecendo esse auxílio aos tradutores menos experientes, como por exemplo, a APTRAD, em Portugal e a ATA, nos EUA.
Em um mundo ideal, as universidades e instituições de ensino de tradução serviriam de ponte entre os iniciantes na profissão e os programas de mentoria, pois, assim, os alunos alcançariam mais rapidamente o mercado de trabalho. É urgente que a academia apoie de forma ampla essa incrível oportunidade de capacitação profissional que são as mentorias. Mas, para tanto, as instituições de ensino precisam abrir um pouco mais suas portas para as associações. E as associações precisam investir mais nessa parceria. Sem esse entendimento entre as partes, o cenário que temos é o de formandos perdendo oportunidades de acelerar seu crescimento profissional. Definitivamente, a academia é uma parte importante do ecossistema dos negócios da indústria de tradução. Por esse motivo, é preciso incentivar o diálogo entre as associações, a academia e as empresas de tradução.
Por sua vez, as empresas de tradução, independentemente do porte, podem e devem se envolver nas iniciativas de mentoria, já que são consumidoras dos serviços prestados por tradutores e, por isso, têm interesse em ver o nível dos serviços de tradução oferecidos pela comunidade aumentar cada vez mais. Como empresas, precisamos de colaboradores capacitados e éticos, cientes de seus direitos e deveres como profissionais, para agilizar os processos de nossos negócios e manter nossos clientes cada vez mais satisfeitos e cientes do valor do que oferecemos a eles. Apoiar a formação e a capacitação dos nossos colaboradores significa também manter um relacionamento cada vez melhor com eles. E fomentar relações saudáveis faz nossa indústria crescer e prosperar.
Convido todos a refletir sobre mentoria e a apoiar de alguma forma os programas das associações de classe, que já provaram ser mais do que úteis para todo o ecossistema dos negócios. Nosso apoio nesse sentido, como empresários, é fundamental para o sucesso e o crescimento de nosso setor, que precisa incentivar cada vez mais atuações conjuntas de todos que participam desse meio. Dar a devida atenção à formação e à orientação dos que estão ingressando no mercado também é uma maneira de apoiar a indústria de tradução e manter elevado o nível e a qualidade de nossos serviços.
Gisley Rabello Ferreira é tradutora, revisora, transcreator e especialista em controle de qualidade nos pares inglês/espanhol > português brasileiro, atuando em várias áreas. É bacharel em espanhol e português e respectivas literaturas e bacharel/licenciada em inglês e nas literaturas americana e inglesa (UERJ), com pós-graduação em tradução de inglês e português (PUC-RJ). Está no mercado desde 1990, atuando em empresas multinacionais de TI e impressão eletrônica, e desde 2001 é sócia e diretora geral da Wordlink Traduções, onde também atua como gerente de projetos sênior e revisora-chefe. É associada da ABRATES e da ATA e é cofundadora da Bliss. Participa do Programa de Mentoria da ABRATES desde 2016, onde ingressou como mentora e depois de um ano passou a integrar o comitê de administração do programa como coordenadora.